A bagunça jurídica da “Grande Naturalização”: uma explicação para leigos

A tese da “Grande Naturalização” vem causando muita confusão jurídica. Saiba o que fazer para garantir o seu direito à cidadania italiana.

Gente, já podemos considerar “bons tempos” o passado recente, quando a grande preocupação de quem buscava realizar o sonho de ter a cidadania italiana reconhecida era sofrer com as looongas filas dos Consulados e reclamar aos quatro ventos quando um errinho de nada era encontrado na documentação!

Mais recentemente, tempos tumultuosos surgiram no horizonte.

Algumas importantes e super impactantes mudanças ocorreram (ou ameaçaram ocorrer) no mundo da cidadania italiana, e essas, sim, tem tirado o sono de muita gente.

Mas será que as polêmicas recentes são tão preocupantes assim?

Será que o período ‘áureo’ em que brasileiros descendentes de italianos podiam se tornar cidadãos da Itália está terminando?

Hoje explico uma das questões atuais mais importantes para nós: a chamada “Grande Naturalização“.

Isso envolve leis antiquíssimas, legislação, juízes, advogados e um monte de terminologias.

Aqui, explico todas as polêmicas sem complicações, para você ficar por dentro do que realmente tem acontecido e do real impacto no mundo da cidadania italiana.

Vamos direto ao ponto.

A GRANDE NATURALIZAÇÃO: ELA PODE IMPEDIR A OBTENÇÃO DA CIDADANIA ITALIANA POR DESCENDENTES?

Sim. Poder, pode.

A “tese da Grande Naturalização” tem o potencial de impedir que brasileiros descendentes de italianos obtenham a cidadania italiana.

MAS ELA VAI, REALMENTE, FAZER ISSO?

Muito possivelmente… não! Mas ainda há uma mínima possibilidade disso ocorrer.

ENTÃO O QUE ESTÁ ACONTENCENDO COM ESSA TAL DE ‘GRANDE NATURALIZAÇÃO’?

O que está acontecendo é uma grande ‘bagunça’ jurídica, com boa parte de culpa brasileira!, aliada a gente muito espertinha no governo italiano.

Uma combinação terrível. O resultado prático: (ainda) mais atrasos nas análises dos pedidos de reconhecimento da cidadania italiana.

E mais dúvidas na cabeça de todo mundo.

Como você possivelmente já sabe (e se ainda não sabe, temos um monte de material explicando tim-tim por tim-tim esta questão!), todo brasileiro descendente de italiano tem direito à cidadania italiana.

É claro que há exceções e vários detalhes à regra, mas no geral (e para simplificar esta explicação) podemos considerá-la como verdadeira.

Se há um italiano em sua linha genealógica direta, isto é, se você for descendente dele (não importa se for filho, neto, bisneto ou tataraneto desse italiano), não importa se você nasceu no Brasil e jamais colocou os pés na Europa, também poderá ser cidadão da Itália – basta requisitar o reconhecimento de sua cidadania.

Pois bem.

Isso é ótimo para brasileiros e brasileiras descendentes de italianos, assim como para milhões de pessoas em todo o mundo.

Mas é óbvio que o governo da Itália vai tentar colocar algumas barreiras nesses pedidos de reconhecimento – afinal, existe MUITA gente no Brasil e no resto do planeta que poderia pedir a cidadania!

Atualmente, uma das principais barreiras que dá uma “segurada” na avalanche de pedidos de cidadania é o tempo.

Por lei, os Consulados italianos devem analisar um requerimento de cidadania em até 02 anos, mas você pode facilmente multiplicar esse prazo por 06 para ter uma ideia do tempo de espera verdadeiro!

E agora, desde 2021, uma nova barreira surgiu: é o problemão chamado de “Grande Naturalização”.

ENTENDENDO A GRANDE NATURALIZAÇÃO

Esta é consequência de uma lambancinha brasileira.

Em resumo: em 14 de dezembro de 1889 (isso mesmo, há mais de 130 anos!), o governo brasileiro aprovou o Decreto 58-A, chamado de ‘Lei da Grande Naturalização’.

Esse decreto dizia o seguinte: todo estrangeiro que estiver no solo brasileiro… torna-se cidadão brasileiro!

Que lindo, não?

Não.

Primeiro porque isso é uma das famosas ‘jabuticabas’ nacionais: no mundo todo, uma pessoa somente se torna cidadã de outro país se ela quiser.

Não existe isso de uma lei nacional ‘obrigar‘ a pessoa, assim, sem mais nem menos, a virar cidadã do país.

E segundo, porque isso bate de frente com a Lei italiana, que impede uma ‘conversão forçada’.

Isso sem contar a insegurança jurídica geral que um decreto como esse gera – e cujas consequências estamos sentindo 133 anos depois…

Esse decreto da ‘Grande Naturalização’ falava que os estrangeiros tinham até meados de 1890 para declarar que NÃO queriam se tornar cidadãos do Brasil, ou seja, que queriam MANTER a cidadania original.

Se não fizessem isso, mágica!, seriam automaticamente considerados brasileiros e pronto.

POR QUE O TEMA É CONTROVERSO?

Gente, imagina você obrigar um estrangeiro, em 1889, a fazer uma declaração de interesse em manter a cidadania original?

Em 1889, quando não havia internet, televisão ou Uber, quando a maioria dos estrangeiros era analfabeta, mal falava português e morava em rincões de difícil acesso?

Isso sem contar com um problema adicional: segundo a Lei italiana, um italiano que obtivesse cidadania de outro país automaticamente perdia a cidadania italiana! Não existia isso de dupla cidadania: ou era italiano ou não era.

Já imaginou o terror que isso gera?

Vamos dar uma palhinha. Uma vez que o Decreto 58-A foi aprovado, então todos os italianos que moravam no Brasil:

• Tornaram-se brasileiros
• E com isso deixaram de ser italianos
• Se não eram mais italianos, então seus descendentes não eram mais descendentes de italianos, mas sim de brasileiros!
• Portanto, a partir de 1890, não há mais descendentes de italianos no Brasil (a não ser que esses estrangeiros requisitaram, de fato, manter a cidadania italiana, o que obviamente ninguém fez)!

QUE BAGUNÇA! QUE ABSURDO! ESSE DECRETO DA GRANDE NATUALIZAÇÃO TEM PROCEDÊNCIA?

Não! Ele é tão absurdo, mas tão absurdo, que NUNCA foi levado a sério – só recentemente.

Em 1907 – há 115 anos, vá mantendo esses números na cabeça… -, uma corte italiana já havia julgado que esse

Decreto brasileiro não valia nada.

Um(a) italiano(a) somente perde uma cidadania e ganha outro se quiser, de forma expressa e explícita.

Não tem essa de lei nenhuma obrigar cidadão italiano a ‘ganhar’ uma nova cidadania.

Martelo batido: há 115 anos já havia sido decidido que o decreto brasileiro não valia nada para os italianos.

Ou seja…brasileiros descendentes de italianos continuavam sendo descendentes de italianos!

E poderiam requisitar o reconhecimento de sua cidadania.

AS REVIRAVOLTAS DE 2021

Como se não estivéssemos todos cansados de pandemia, crise econômica e política, lá no final do ano passado mais uma bomba caiu no colo dos ítalo-brasileiros.

Nos últimos anos, e de maneira estranhamente rápida, a justiça italiana tem julgado um pedido, feito pelo equivalente italiano do ‘Advogado Geral da União’ aí do Brasil, que basicamente falava o seguinte: pedir reconhecimento da cidadania italiana por descendência não era algo viável porque o Decreto 58-A de 130 anos atrás tinha retirado a cidadania italiana dos estrangeiros que estavam no Brasil!

Ora, ora…daí você me diz, “mas, Dario, essa ‘tese’ já não havia sido rejeitada em 1907?!”. Sim, foi mesmo. Mas quer uma surpresa?

Em pleno 2021, a justiça italiana deu OK para o pedido do AGU! (choque!)

Isso mesmo: o tribunal que julgava o caso achou que o AGU tinha razão.

Na hora, advogados e juristas italianos entraram com pedidos para revisão dessa decisão, porque não há o que justifique tal bobagem prosseguir.

Não há argumentos jurídicos que sustentem essa decisão.

Idas e vindas nos tribunais, no final de 2021 houve novo julgamento da questão e a “tese da Grande Naturalização” foi novamente rejeitada (vivas!).

Ou seja, precisamos de bates-e-voltas nos tribunais de 2021 para reconhecer que a decisão lá de 1907 estava certa.

Só não podemos ficar muito felizes com esse aparente desfecho por dois motivos.

O QUE AINDA PREOCUPA COM RELAÇÃO À GRANDE NATURALIZAÇÃO

O primeiro é que este ainda não é um desfecho: a decisão final, definitiva mesmo, da justiça italiana sobre a questão da “Grande Naturalização” só ocorrerá em uma sessão extraordinária do próximo dia 12 de julho.

Data já marcada e esperada com grande ansiedade!

Espera-se que, a partir dessa decisão, o tema seja ‘fechado’ em definitivo e nunca mais precise ser discutido.

E qual será o veredicto? A enorme maioria dos juristas acredita que a “Grande Naturalização” será derrubada, e que poderemos prosseguir ‘normalmente’ com os pedidos de reconhecimento de cidadania italiana para brasileiros descendentes.

O mundo jurídico nem consegue imaginar o que aconteceria se a Grande Naturalização fosse aceita: isso significaria que todos os pedidos de cidadania feitos até hoje precisariam ser revistos? Que as filas atuais de análise em comuni e Consulados seriam ‘zeradas’? Que boa parte dos descendentes perderia a cidadania italiana?

Seria o caos.

Enquanto isso, entra o segundo motivo para preocupação.

Até que a sentença definitiva seja apresentada, o Ministério do Interior italiano (que foi quem originalmente propagou a tese da Grande Naturalização repaginada) tem orientado os comuni a suspender ou atrasar os serviços de reconhecimento de cidadania italiana por descendência.

Afinal, como podem esses órgãos públicos continuar trabalhando em algo que está ‘em suspenso’ na Justiça?

Olha, a gente até entende que existem MUITOS pedidos de reconhecimento de cidadania na fila da burocracia italiana, mas esse tipo de situação, claramente manipulada para dar um fôlego aos órgãos públicos, chega a ser ridícula.

Tanto que muitos comuni estão ativamente ignorando a orientação, e continuam a trabalhar normalmente, porém o risco de um comune pagar essa ¨desculpinha¨ para engavetar o seu processo, existe!

CONCLUSÃO

Existem inúmeros motivos para que o governo italiano – ou parte dele – queira “dar uma segurada” nos pedidos de cidadania.

Se isso faz ou não sentido, nem irei discutir a questão. Agora, o que é bem “estranho”, para dizer o mínimo!, é tentar fazer isso com base em questões antiquíssimas, defasadas e já rejeitadas há mais de 100 anos!!!

A “Grande Naturalização” deverá ser definitivamente enterrada em julho deste ano. Que descanse em paz. Já causou prejuízos demais. Até lá, algumas turbulências de instabilidade jurídica poderão ser esperadas, mas devem passar rápido.

Neste momento, nosso conselho para quem está em busca de seu direito de ter a cidadania italiana reconhecida é optar pelo método mais prático, rápido e eficaz atualmente em uso: a via jurídica.

Explicamos tudinho sobre a via jurídica aqui neste texto, com orientações e dicas de como proceder para se tornar, o quanto antes, um cidadão ou uma cidadã da Itália!

Cidadania Italiana pela via Judicial em 2022 – Reconhecer o seu direito ficou mais fácil?

Seguindo o link acima, você verá como a via jurídica garante o auxílio de advogados especializados em cidadania italiana para fazer a lei ser cumprida de verdade, reduzindo drasticamente o tempo de análise dos pedidos para seu sonho da cidadania ser finalmente realizado (com taxas altíssimas de sucesso).

E se tiver ainda dúvidas, pode entrar em contato com os advogados parceiros que irão te auxiliar em tudo o que você precisar para que você se reconheça cidadão-ã italiano-a!

Espero que este resumo tenha ajudado a compreender esta questão.

Se tiver qualquer dúvida, deixe nos comentários e vamos discutir os desdobramentos da ‘Grande Naturalização’ (ou verdadeira ‘Grande Dor de Cabeça’, isso sim).